top of page

Mara Rosa/GO: Justiça nega acesso de produtores rurais à Recuperação Judicial

  • Foto do escritor: Equipe Sergio Schmidt Advocacia
    Equipe Sergio Schmidt Advocacia
  • 11 de nov.
  • 4 min de leitura
ree

Uma recente decisão da Vara Cível da Comarca de Mara Rosa (GO) negou o pedido de Recuperação Judicial (RJ) formulado pelos produtores rurais Sara Alves de Araújo e Célio Evangelista Silva. O caso, que envolveu reviravolta processual, reforça um ponto essencial do Direito Empresarial: o registro na Junta Comercial é requisito indispensável para que o produtor rural possa requerer Recuperação Judicial, ainda que ele exerça regularmente atividade empresarial no campo.


A decisão foi proferida pelo juiz Thiago Mehari, que acolheu os argumentos do Banco Santander (Brasil) S.A. e indeferiu o processamento da RJ pela ausência de comprovação do registro individual dos produtores como empresários rurais no momento do ajuizamento da ação.

 


A controvérsia: exercício da atividade rural sem registro e os limites da equiparação

O art. 971 do Código Civil estabelece que o produtor rural pode exercer sua atividade sem necessidade de registro na Junta Comercial, diferentemente dos empresários urbanos. Todavia, o mesmo dispositivo confere ao produtor a faculdade de optar pela inscrição, hipótese em que, após o registro, ele passa a ser equiparado aos empresários sujeitos ao regime jurídico empresarial, para todos os efeitos de direito.


Em outras palavras, o produtor rural pode atuar informalmente como empresário, mas somente se torna sujeito às regras do Direito Empresarial — incluindo o acesso à Recuperação Judicial — após efetuar o registro público de sua atividade.


Essa distinção foi consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Tema Repetitivo 1.145, que reconheceu a possibilidade do produtor rural demonstrar exercício regular da atividade por mais de dois anos antes do registro, mas deixou claro que o registro deve existir no momento do ajuizamento da Recuperação Judicial, para legitimar o pedido e submeter o requerente ao regime empresarial.

 

O erro processual: a comum confusão entre empresário individual e sócio de sociedade empresária

O caso em análise evidencia uma confusão ainda bastante disseminada no Brasil — inclusive entre operadores do Direito — quanto à diferença entre o empresário individual e o sócio de uma sociedade empresária. É frequente que se atribua, de forma equivocada, o título de “empresário” ao sócio ou administrador de uma pessoa jurídica, como se ambos os institutos fossem equivalentes.


No entanto, sob a ótica do Direito Empresarial, tratam-se de figuras jurídicas distintas. O empresário individual é a própria pessoa física que exerce profissionalmente atividade econômica organizada, em nome próprio e sob sua responsabilidade. Já o sócio de uma sociedade empresária, ainda que participe ativamente da gestão, não é empresário, mas apenas integrante de uma pessoa jurídica dotada de personalidade própria.


No caso concreto, os produtores rurais não apresentaram registro individual como empresários rurais, optando por fundamentar o pedido de Recuperação Judicial no contrato social da empresa AGROPECUÁRIA CS E INVESTIMENTOS LTDA., da qual são apenas sócios. O juiz Thiago Mehari foi categórico ao esclarecer que a condição de sócio de uma sociedade limitada não se confunde com a de empresário, e que o registro da pessoa jurídica não supre a ausência de registro individual das pessoas físicas como empresários rurais.


Assim, o simples fato de ser sócio de uma empresa não torna o indivíduo sujeito ao regime jurídico empresarial, nem lhe confere legitimidade para requerer Recuperação Judicial em nome próprio.

 

Histórico do processo e reviravolta judicial

O processo teve trâmite conturbado. Inicialmente, o juízo de Mara Rosa havia deferido o processamento da Recuperação Judicial. O Banco Santander recorreu ao Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), que reformou a decisão e indeferiu o pedido, justamente por ausência de registro dos produtores na Junta Comercial.


Mesmo após o acórdão do TJGO, o magistrado de primeira instância proferiu nova decisão, reconsiderando o pedido de processamento da RJ com base no fato dos produtores rurais serem sócios da sociedade empresária AGROPECUÁRIA CS E INVESTIMENTOS LTDA., utilizada pelos requerentes como fundamento substitutivo.


Diante da contradição, o Santander apresentou embargos de declaração, sustentando violação ao julgado do Tribunal. Ao reapreciar o caso, o juiz Thiago Mehari reconheceu o equívoco e acolheu os embargos, reafirmando a indispensabilidade do registro individual dos produtores rurais para o processamento da RJ.

 

Decisão final e lições práticas

Na decisão final, o juízo de Mara Rosa indeferiu o pedido de Recuperação Judicial por ausência de registro prévio dos produtores rurais na Junta Comercial, requisito essencial previsto no art. 971 do Código Civil, combinado com o art. 48 da Lei nº 11.101/2005.


A decisão reafirma um princípio basilar do Direito Empresarial: o registro não é mera formalidade burocrática, mas ato constitutivo da condição jurídica necessária para acessar institutos próprios da atividade empresarial, como a Recuperação Judicial e a falência.


O caso serve como alerta relevante para produtores rurais e operadores do direito:


Ainda que o exercício da atividade rural possa se dar de forma regular sem inscrição, a proteção legal da Recuperação Judicial depende de registro prévio e válido na Junta Comercial, pois somente a partir desse momento o produtor passa a integrar o sistema empresarial e a gozar dos instrumentos de reestruturação previstos na Lei nº 11.101/2005.


A decisão, portanto, reforça a importância do planejamento jurídico preventivo no campo, demonstrando que o desconhecimento ou a negligência em relação à formalização da atividade rural pode inviabilizar o acesso a mecanismos de preservação da empresa e do patrimônio produtivo, essenciais à continuidade das atividades agrícolas e à estabilidade do agronegócio.


Para conhecer mais detalhes sobre o tema nos links abaixo:



 

Análise da decisão judicial foi realizada pelo advogado Sergio Schmidt – OAB/GO 51041, Administrador Judicial, Mediador e Conciliador, Especialista em Direito Empresarial.

 

Para conhecer a integra da decisão acesse o arquivo abaixo:


Comentários


© 2024 Por EmpresaemCrise.com

Empresa em Crise

bottom of page