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2. Sobre o processamento da recuperação judicial

2.2. Antecipação dos benefícios ao devedor antes do deferimento do processamento da rec. judicial

A Lei 11.101/2005 previu duas possibilidades do devedor antecipar alguns dos efeitos (benefícios) da Recuperação Judicial, antes mesmo de requerer este benefício legal. Essa antecipação de efeitos tem por objetivo proteger o devedor e possibilitar um ambiente mais favorável para autocomposição deste com seus credores.    

Instalação de procedimento de mediação: Objetivando incentivar os meios de autocomposição, a Lei 11.101/2005 previu a possibilidade do devedor requerer a suspensão das ações de execuções propostas pelos credores contra ele, pelo prazo de 60 (sessenta) dias, e buscar, por meio da mediação e conciliação, uma tentativa de acordo de pagamento das dívidas.​

Para requerer a suspensão das execuções, o devedor deverá comprovar que cumpre os requisitos legais exigidos para a recuperação judicial (1) (2), bem como comprovar que instaurou os procedimentos de conciliação e mediação em relação a todas as execuções que requereu suspensão. O procedimento de mediação e conciliação pode ser instaurado junto ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSC vinculado ao Juízo competente (3) ou junto a uma câmara privada especializada em mediação e conciliação.

Caso o devedor requeira a recuperação judicial após o transcurso do prazo de 60 dias destinado à tentativa de conciliação ou mediação prévia, esse período será descontado do prazo de suspensão das ações e execuções (stay period), previsto no artigo 6º, § 4º, da Lei nº 11.101/2005. Ressalte-se que o stay period tem duração inicial de 180 dias, contados a partir do deferimento do processamento da recuperação judicial, podendo ser prorrogado por igual período.

Além de possibilitar a suspensão temporária das execuções, o procedimento prévio de mediação ou conciliação pode ser altamente estratégico para o devedor na busca por uma solução consensual e menos traumática para sua crise econômico-financeira. Na expectativa de uma eventual recuperação do devedor, os credores, em geral, demonstram maior flexibilidade e disposição para negociar, o que pode viabilizar a celebração de acordos capazes de equacionar o passivo sem a necessidade de ingresso em recuperação judicial.

Ademais, mesmo que as tratativas não resultem em adesão unânime dos credores, havendo a formalização de acordos com credores que representem os percentuais mínimos exigidos por lei, o devedor poderá optar pela recuperação extrajudicial, instrumento que lhe permite submeter os demais credores às condições pactuadas, desde que observados os requisitos previstos na legislação. Trata-se, portanto, de uma alternativa menos onerosa, menos complexa e potencialmente mais eficiente, cuja viabilidade pode surgir justamente a partir do sucesso parcial das negociações conduzidas durante o período de mediação.

 

Concessão de tutela de urgência: A Lei 11.101/2005, no § 12 do Art. 6º, previu também a possibilidade de concessão de tutela de urgência para antecipar os efeitos da recuperação judicial, desde que cumpridos os requisitos previstos no Art. 300 do Código de Processo Civil. Para tanto, é necessário que o devedor comprove a probabilidade do direito invocado (fumus boni iuris) e o risco de dano ou de comprometimento ao resultado útil do processo (periculum in mora).

Como probabilidade do direito, temos que o requerente, ao mínimo, deve comprovar que possui os requisitos necessários para requerer a recuperação judicial (1) (2). Já em relação ao perigo de dano, poderíamos citar, como motivo justo, a iminência de constrição de ativos por parte de devedores sujeitos aos efeitos da recuperação judicial ou a iminência de busca e apreensão de um bem de capital essencial a manutenção da atividade da empresa por credor fiduciário, cujo resultado poderia comprometer a estruturação de uma negociação coletiva.

O devedor terá ainda que comprovar a ausência de tempo hábil para requerer de imediato o pedido de recuperação judicial, o que poderia ser justificado pela necessidade de prazo mínimo para organização dos documentos exigidos pela lei (4). Havendo a antecipação da tutela, o devedor terá que realizar o aditamento da petição inicial, com a complementação dos argumentos e documentos exigidos no prazo de 15 (quinze) dias, a menos que Juiz tenha fixado prazo maior.

Entendemos que este pedido de tutela de urgência também é cabível e oportuno de ser realizado na própria petição inicial de requerimento da recuperação judicial, com objetivo antecipar os efeitos próprios do deferimento do processamento da RJ. Tal medida mostra-se especialmente relevante para os casos em que o Juízo, antes de decidir sobre o deferimento, determine a realização de perícia de constatação prévia, situação que pode postergar a proteção legal que o devedor em crise necessita.

 

Essas ferramentas legais foram concebidos para viabilizar um processo de reestruturação mais controlado, eficiente e menos traumático para as empresas em dificuldade. A possibilidade de antecipar os efeitos da recuperação judicial permite mitigar o agravamento do quadro financeiro, conferindo ao devedor condições para atuar de forma preventiva na estabilização de suas operações e na preservação de sua atividade empresarial, aumentando, assim, as chances de êxito na superação da crise e na continuidade dos negócios.

Legislação aplicável ao tema:

Lei 11.101/2005

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:

(...)

§ 12. Observado o disposto no art. 300 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), o juiz poderá antecipar total ou parcialmente os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial

 

Art. 20-B. Serão admitidas conciliações e mediações antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial, notadamente: 

IV - na hipótese de negociação de dívidas e respectivas formas de pagamento entre a empresa em dificuldade e seus credores, em caráter antecedente ao ajuizamento de pedido de recuperação judicial

§ 1º Na hipótese prevista no inciso IV do caput deste artigo, será facultado às empresas em dificuldade que preencham os requisitos legais para requerer recuperação judicial obter tutela de urgência cautelar, nos termos do art. 305 e seguintes da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), a fim de que sejam suspensas as execuções contra elas propostas pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, para tentativa de composição com seus credores, em procedimento de mediação ou conciliação já instaurado perante o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) do tribunal competente ou da câmara especializada, observados, no que couber, os arts. 16 e 17 da Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015.

Código de Processo Civil

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.

§ 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:

I - o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar;

(...)

§ 2º Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito.

§ 3º O aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas processuais.

§ 4º Na petição inicial a que se refere o caput deste artigo, o autor terá de indicar o valor da causa, que deve levar em consideração o pedido de tutela final.

§ 5º O autor indicará na petição inicial, ainda, que pretende valer-se do benefício previsto no caput deste artigo.

§ 6º Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito.

Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Parágrafo único. Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303 .

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