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1. Sobre o pedido de Recuperação Judicial

1.7. Requisitos da petição inicial e documentos obrigatórios

Além da comprovação de cumprimento dos requisitos necessários para ter acesso a recuperação judicial (1) (2), a legislação também exige que na fundamentação da petição inicial sejam expostas, de forma detalhada, as causas concretas da situação patrimonial do devedor e as razões de sua crise econômico-financeira.  Ou seja, deverão ser apresentadas, numa relação causa e efeito, os fatores que geraram a ausência de liquidez ou o estado de insolvência do empresário (Ex.: eventos externos, retração da economia, aumento dos juros, etc.).

Outro aspecto relevante refere-se à necessidade de, na exposição das causas da crise, o empresário rural comprovar a efetiva situação de crise econômico-financeira, caracterizada pela insuficiência de recursos financeiros e patrimoniais para o cumprimento de suas obrigações, nos termos do art. 51, § 6º, I, da Lei nº 11.101/2005. Tal exigência, contudo, a nosso entendimento, não se limita ao empresário rural, estendendo-se a todos os empresários e sociedades empresárias que pretendam se valer do instituto da recuperação judicial, uma vez que o art. 47 da referida Lei estabelece como finalidade do processo a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor. Assim, não estando o devedor em crise, é juridicamente inviável o acesso à recuperação judicial, sob pena de desvio da finalidade legal do instituto.

O valor da causa da ação judicial será equivalente ao total dos créditos sujeitos a recuperação judicial, conforme declarado pelo devedor na lista de credores apresentada. As custas judiciais serão calculadas com base nesse montante. Quanto a eventual pedido de gratuidade da justiça, este requer a comprovação de insuficiência de recursos financeiros pela empresa, não sendo suficientes os argumentos e documentos obrigatórios anexados ao pedido de recuperação judicial.

Em anexo a petição inicial, o empresário deverá apresentar ainda os seguintes documentos:

  1. Demonstrações contábeis relativos aos últimos 3 últimos exercícios sociais: Essa documentação contábil deve ser composta por balanço patrimonial, demonstração de resultados de cada exercício, demonstração de resultados acumulados do período de 3 anos e relatório de fluxo de caixa. Caso o balanço patrimonial do último exercício ainda não tenha sido entregue, é possível a apresentação de balanço prévio, mediante sua substituição pelo definitivo até o prazo final de entrega estipulado pela lei societária. 

  2. Demonstração contábil realizada especialmente para instruir o pedido: Trata-se da apresentação de balancete, demonstrativo de resultados e relatório de fluxo de caixa, correspondente ao período entre a data do último balanço apresentado até o último dia do mês anterior a data em que esteja sendo requerida a recuperação judicial. É imprescindível que todas as dívidas da empresa estejam devidamente incluídas neste registro contábil.

  3. Projeção de fluxo de caixa: Fluxo de caixa projetado refere-se a projeção de entradas (receitas) e saídas (despesas e custos) em período futuro. A lei não especifica o período, no entanto a recomendação 103 do CNJ prevê o prazo de 24 meses.  

  4. Descrição das sociedades integrantes de grupo societário: Independentemente do pedido de recuperação judicial ter sido realizado em consolidação processual ou substancial, a lei determina que seja apresentada uma relação detalhada de todas as empresas ou sociedades que compõem o grupo econômico ao qual pertence a empresa requerente da recuperação judicial.

  5. Relação de credores: Devem ser listados todos os credores cujos créditos estejam, ou não, sujeitos a recuperação judicial, vencidos e a vencer, incluídas também as obrigações de fazer ou de dar. A lista deve trazer ainda o endereço e e-mail de cada um dos credores. Já em relação aos créditos, deverá ser informado sua natureza (trabalhista, garantia real, quirografário, ME/EPP ou extraconcursal), sua origem (negócio jurídico que originou o crédito), regime de vencimentos e valor atualizado até a data do pedido de recuperação judicial.

  6. Relação de empregados: Nesta relação deve constar o nome de cada um dos empregados, sua função, salários, indenizações e outros valores a que tem direito. Também deverão ser apresentados eventuais valores pendentes de pagamento com a respectiva indicação do mês de competência. Prestadores de serviços não são considerados empregados e não necessitam figurar nesta relação.

  7. Certidão de regularidade, atos constitutivos e de nomeação dos administradores: Para comprovar o exercício regular da atividade empresarial, requisito essencial da recuperação judicial, o requerente deve apresentar uma Certidão Simplificada expedida pela Junta Comercial. Já em relação aos atos constitutivos, faz-se necessário a entrega do contrato social ou estatuto social, incluindo todas as alterações subsequentes. Também é obrigatória a entrega das atas de nomeação dos atuais administradores da sociedade;

  8. Relação de bens dos sócios e administradores: Independentemente da sociedade ser de responsabilidade limitada ou ilimitada, é obrigatório que os sócios controladores e administradores apresentem um inventário detalhado dos bens que integram seu patrimônio pessoal. Sócios minoritários não estão sujeitos a esta exigência;

  9. Extratos de contas bancárias e aplicações financeiras: O devedor deverá apresentar extratos atualizados de todas as contas bancárias, incluindo aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive investimentos em fundos e bolsa de valores. Para fim de assegurar a veracidade das informações, todos os extratos devem ser emitidos diretamente em websites e aplicativos oficiais ou em agências físicas das instituições financeiras responsáveis.

  10. Certidões de protesto de títulos: Com objetivo de confirmar a crise econômico-financeira, é exigida apresentação de certidões expedidas por cartórios de protesto de títulos situados na comarca da sede do devedor e de todos os locais onde este possui filiais;

  11. Relação de ações judiciais e procedimentos arbitrais: Deverá ser apresentada uma lista detalhada de todas as ações judiciais e procedimentos arbitrais em que o devedor seja parte, seja como autor ou réu. Esta relação deve incluir ações trabalhistas, processos relativos a créditos extraconcursais e execuções fiscais. Devido ao potencial impacto dessas ações no patrimônio do devedor, é necessário também fornecer uma estimativa dos valores envolvidos em cada caso;

  12. Relatório detalhado do passivo fiscal: Este relatório deverá identificar o valor de todos os tributos vencidos e a vencer, parcelamentos administrativos, bem como medidas judiciais e administrativas tomadas pelo devedor para rediscutir o montante devido;

  13. Relação de bens e direitos do ativo NÃO circulante: Em relação a este quesito, deverá ser apresentada relação de todos os bens não classificados contabilmente como bens do ativo circulante, incluindo os bens objeto de alienação fiduciária, arrendamento mercantil e reserva de domínio. Em relação a estes últimos bens, faz-se necessário ainda a apresentação dos contratos celebrados.

A empresa também deverá disponibilizar ao juiz e ao administrador judicial todos os documentos contábeis e relatórios auxiliares essenciais para verificar e compreender os dados financeiros apresentados nos balanços, demonstrações de resultado e fluxos de caixa. Adicionalmente, mediante requerimento fundamentado, o juiz poderá autorizar que tais documentos sejam disponibilizados a terceiros interessados.

Se a empresa requerente da recuperação judicial for classificada como microempresa ou empresa de pequeno porte, as demonstrações contábeis podem ser apresentadas de forma simplificada, nos termos das regras estabelecidas pela legislação específica desta categoria empresarial.

Para o caso de pedido de recuperação judicial realizado por produtor rural, as demonstrações contábeis descritas nos itens “a” e “b” acima, serão substituídas por livro caixa digital do produtor rural - LCDPR, pela declaração de imposto de renda pessoa física - DIRPF e balanço patrimonial dos últimos dois anos. Quando não for exigido do produtor rural o livro caixa digital do produtor rural – LCDPR, este será substituído pelo livro caixa utilizado para elaboração da declaração de imposto de renda pessoa física – DIRPF.

Ante ao princípio da instrumentalidade, a ausência de apresentação de algum dos documentos necessários não deve implicar no imediato indeferimento do pedido. O Juiz, neste caso, por força do que dispõe o Art. 189 da Lei 11.101/2005 e o Art. 321 do Código de Processo Civil, deverá determinar que o requerente complemente a documentação, especificando quais os documentos faltantes.

As informações trazidas na petição inicial, acompanhada da extensa lista de documentos, tem por objetivo proporcionar aos credores, um completo entendimento sobre a atividade operacional e situação patrimonial do devedor. Essas informações são essenciais para que os credores possam avaliar a profundidade e a seriedade da crise econômico-financeira enfrentada pelo requerente da recuperação judicial.

Doutrina, enunciados, jurisprudência e artigos sobre o tema:

Enunciado 78 - II Jornada de Direito Comercial

O pedido de recuperação judicial deve ser instruído com a relação completa de todos os credores do devedor, sujeitos ou não à recuperação judicial, inclusive fiscais, para um completo e adequado conhecimento da situação econômico-financeira do devedor.

Legislação aplicável ao tema:

Lei 11.101/2005

Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:

I – a exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira;

II – as demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável e compostas obrigatoriamente de:

a) balanço patrimonial;

b) demonstração de resultados acumulados;

c) demonstração do resultado desde o último exercício social;

d) relatório gerencial de fluxo de caixa e de sua projeção;

e) descrição das sociedades de grupo societário, de fato ou de direito;

III - a relação nominal completa dos credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço físico e eletrônico de cada um, a natureza, conforme estabelecido nos arts. 83 e 84 desta Lei, e o valor atualizado do crédito, com a discriminação de sua origem, e o regime dos vencimentos; 

IV – a relação integral dos empregados, em que constem as respectivas funções, salários, indenizações e outras parcelas a que têm direito, com o correspondente mês de competência, e a discriminação dos valores pendentes de pagamento;

V – certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores;

VI – a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores do devedor;

VII – os extratos atualizados das contas bancárias do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras;

VIII – certidões dos cartórios de protestos situados na comarca do domicílio ou sede do devedor e naquelas onde possui filial;

IX - a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais e procedimentos arbitrais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados;

X - o relatório detalhado do passivo fiscal; e

XI - a relação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante, incluídos aqueles não sujeitos à recuperação judicial, acompanhada dos negócios jurídicos celebrados com os credores de que trata o § 3º do art. 49 desta Lei.

§ 1º Os documentos de escrituração contábil e demais relatórios auxiliares, na forma e no suporte previstos em lei, permanecerão à disposição do juízo, do administrador judicial e, mediante autorização judicial, de qualquer interessado.

§ 2º Com relação à exigência prevista no inciso II do caput deste artigo, as microempresas e empresas de pequeno porte poderão apresentar livros e escrituração contábil simplificados nos termos da legislação específica.

§ 3º O juiz poderá determinar o depósito em cartório dos documentos a que se referem os §§ 1º e 2º deste artigo ou de cópia destes.

§ 4º Na hipótese de o ajuizamento da recuperação judicial ocorrer antes da data final de entrega do balanço correspondente ao exercício anterior, o devedor apresentará balanço prévio e juntará o balanço definitivo no prazo da lei societária aplicável.

§ 5º O valor da causa corresponderá ao montante total dos créditos sujeitos à recuperação judicial.

§ 6º Em relação ao período de que trata o § 3º do art. 48 desta Lei:

I - a exposição referida no inciso I do caput deste artigo deverá comprovar a crise de insolvência, caracterizada pela insuficiência de recursos financeiros ou patrimoniais com liquidez suficiente para saldar suas dívidas;

II - os requisitos do inciso II do caput deste artigo serão substituídos pelos documentos mencionados no § 3º do art. 48 desta Lei relativos aos últimos 2 (dois) anos.

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Art. 189. Aplica-se, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei, o disposto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), desde que não seja incompatível com os princípios desta Lei.

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Código de Processo Civil

Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.

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