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4. Plano de Rec. Judicial - Propostas do devedor

4.6. Descontos nas dívidas e alterações nas condições de pagamento

Planos de recuperação judicial (1) que contemplam propostas de deságio ou remissão parcial das dívidas, concessão de prazos de carência, alongamento dos prazos para pagamento, adoção de novos índices de correção monetária e redução nas taxas de juros são instrumentos amplamente utilizados para a reorganização financeira das empresas em dificuldade. Essas medidas configuram estratégias essenciais para assegurar a continuidade das atividades empresariais, permitindo a adequação do fluxo de caixa à realidade econômica e operacional da empresa em recuperação.

As propostas de readequação do passivo empresarial devem, no entanto, refletir o equilíbrio entre os interesses dos credores e a efetiva necessidade para preservação da atividade empresarial. A análise e deliberação sobre tais propostas compete, por regra, à Assembleia Geral de Credores (AGC). Caso a maioria qualificada dos credores entenda que as propostas apresentadas atendem aos requisitos legais e econômicos necessários, estas serão aprovadas. Entretanto, se os credores considerarem as condições propostas excessivamente gravosas ou inviáveis, poderão rejeitar o plano. Nesse caso, a lei prevê a possibilidade de que os próprios credores apresentem um plano alternativo, afastando o risco da imediata decretação da falência.

Individualmente o credor descontente com as propostas de pagamento apresentadas pelo devedor no plano de recuperação judicial poderá buscar persuadir os demais credores com suas razões e justificativas, bem como votar contrariamente a sua aprovação na Assembleia Geral de Credores – AGC. Contudo, caso prevaleça a decisão da maioria pela aprovação do plano de recuperação judicial, o credor dissidente estará vinculado às novas condições aprovadas, não lhe restando outra alternativa senão aceitá-las. Importa ressaltar que o Poder Judiciário não possui competência para interferir no mérito das deliberações econômicas aprovadas pela maioria dos credores.

Importante destacar, porém, que o plano de recuperação deve conter propostas claras e objetivas, observadas também as disposições do artigo 122 do Código Civil, que vedam a realização de negócios jurídicos subordinados a condições potestativas, que dependam exclusivamente da vontade do devedor ou de eventos futuros e incertos. A observância dessa norma é essencial para preservar a segurança jurídica e a previsibilidade indispensáveis ao processo de recuperação. Exemplos de condições vedadas incluem pagamentos futuros condicionados a metas de faturamento ou de lucro, cujo atingimento depende da atuação do devedor ou de fatores de mercado.

Os ganhos financeiros obtidos com descontos em dívidas concedidos no âmbito do plano de recuperação judicial têm tratamento tributário diferenciado e vantajoso. Esses valores são excluídos da base de cálculo do PIS e da Cofins, reduzindo significativamente a carga tributária incidente. Além disso, tais ganhos podem ser integralmente compensados com prejuízos fiscais acumulados em exercícios anteriores para fins de apuração do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), sem a limitação de 30% prevista na legislação tributária. Tais benefícios fiscais, no entanto, não se aplicam em relação aos créditos de credores que detenham a condição de sócios, controladores, controlados, coligados ou ainda administradores da empresa Recuperanda.

Em resumo, o plano de recuperação judicial é instrumento flexível e adaptável as necessidades de cada caso concreto, cabendo aos credores, através da Assembleia Geral, deliberar sobre a pertinência e viabilidade das propostas apresentadas. Compete exclusivamente aos credores avaliar o equilíbrio entre as condições oferecidas no plano e a preservação de seus legítimos interesses, buscando harmonizar a continuidade das atividades de empresas economicamente viáveis com a satisfação sustentável de seus créditos.

Doutrina, enunciados, jurisprudência e artigos sobre o tema:

Manoel Justino Bezerra Filho

"Talvez seja recomendável aqui uma observação no que tange a prazos e condições especiais de pagamento. A experiência, aliás já bem antiga, demonstra que o credor, muitas vezes, concorda com exigências do devedor, com medo de que esse venha a falir. Dessa forma, o perigo de vir a falir, ao invés de se tornar um temor para o devedor, torna-se, na realidade, uma ameaça do devedor ao credor. Tudo isso, para anotar que tem havido o que se poderia chamar de abuso, por parte de devedores, que apresentam planos para cumprimento em tempo extremamente dilatado (10, 20 anos, ou mais) e com oferta de pagamento com deságios descabidos (pagamento com 98% de deságio, por exemplo). Proceder assim não é exercício de direito, é abuso de direito. Ofertar 2% de pagamento ou dizer que nada vai pagar, são quase equivalentes. Ressalte-se sempre que a recuperação não é caminho para enriquecimento do devedor, é caminho para preservação da sociedade empresária, reservada ao empresário honesto e eficiente, que esteja passando por uma crise econômico-financeira e da qual sairá, com sacrifício dos credores e sacrifício próprio. No entanto, sacrifício de ambas as partes, sacrifício razoável, é o que o legislador almeja." Bezerra Filho, Manoel Justino; Bezerra, Adriano Ribeiro Lyra; Santos, Eronides A. Rodrigues dos. Lei de recuperação de empresas e falência: Lei 11.101/2005 : comentada artigo por artigo (Portuguese Edition) (p. 403). Thomson Reuters Revista dos Tribunais. Edição do Kindle.

Enunciado 46 - I Jornada de Direito Comercial

Não compete ao juiz deixar de conceder a recuperação judicial ou de homologar a extrajudicial com fundamento na análise econômico-financeira do plano de recuperação aprovado pelos credores.

Legislação aplicável ao tema:

Lei 11.101/2005

Art. 35. A assembléia-geral de credores terá por atribuições deliberar sobre:

I – na recuperação judicial:

a) aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor;

Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros:

I – concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;

IX – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;

§ 2º Nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial.

Art. 50-A. Nas hipóteses de renegociação de dívidas de pessoa jurídica no âmbito de processo de recuperação judicial, estejam as dívidas sujeitas ou não a esta, e do reconhecimento de seus efeitos nas demonstrações financeiras das sociedades, deverão ser observadas as seguintes disposições: 

I - a receita obtida pelo devedor não será computada na apuração da base de cálculo da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

II - o ganho obtido pelo devedor com a redução da dívida não se sujeitará ao limite percentual de que tratam os arts. 42 e 58 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, na apuração do imposto sobre a renda e da CSLL; e

III - as despesas correspondentes às obrigações assumidas no plano de recuperação judicial serão consideradas dedutíveis na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, desde que não tenham sido objeto de dedução anterior.

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo não se aplica à hipótese de dívida com: 

I - pessoa jurídica que seja controladora, controlada, coligada ou interligada; ou

II - pessoa física que seja acionista controladora, sócia, titular ou administradora da pessoa jurídica devedora.

Art. 56. Havendo objeção de qualquer credor ao plano de recuperação judicial, o juiz convocará a assembléia-geral de credores para deliberar sobre o plano de recuperação.

§ 3º O plano de recuperação judicial poderá sofrer alterações na assembléia-geral, desde que haja expressa concordância do devedor e em termos que não impliquem diminuição dos direitos exclusivamente dos credores ausentes.

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.

Código Civil

Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.

Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados:

I - as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas;

II - as condições ilícitas, ou de fazer coisa ilícita;

III - as condições incompreensíveis ou contraditórias.

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