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1. Sobre o pedido de recuperação judicial

1.1. Finalidade e objetivos da recuperação judicial

A recuperação judicial possui, como objetivo principal, permitir que o devedor (empresário individual ou sociedade empresária) em situação de crise econômico-financeira, possa superar essa fase adversa e evitar a falência. Por meio deste processo, busca-se preservar a empresa como fonte produtora, os empregos, os interesses dos credores e de toda a sociedade. Aqui estão alguns pontos chave explicados de maneira objetiva:

  1. Empresa: Em primeiro lugar, é fundamental destacar que o conceito de "empresa" não deve ser confundido com o empresário individual, sociedade empresária ou seus sócios. No contexto da legislação pertinente à recuperação judicial, o termo "empresa" é utilizado para designar o empreendimento em si, isto é, a atividade econômica organizada que objetiva a produção e a circulação de bens ou de serviços. Esse conceito abrange os meios empregados para a realização dessas atividades, incluindo recursos humanos, tecnológicos, organizacionais e financeiros. É a manutenção do funcionamento deste empreendimento, ou desta atividade econômica organizada, que a recuperação judicial visa proteger, desde que isso seja viável.

  2. Crise econômico-financeira: Esta expressão refere-se à situação em que a empresa se encontra, ou seja, em dificuldades para pagar suas dívidas e manter suas operações normais. Isso pode ocorrer por diversos fatores, como queda nas vendas, aumento das despesas, eventos inesperados (incêndio, enchente, Codvid-19, etc.) ou, até mesmo, má gestão administrativo-financeira.

  3. Manutenção da fonte produtora: O principal objetivo do processo de recuperação judicial é proporcionar à empresa em crise uma oportunidade para esta se reestruturar financeiramente e operacionalmente, permitindo que continue a produzir bens ou prestar serviços. Isso se baseia no pressuposto de que a continuidade operacional da empresa pode ser economicamente viável e benéfica para os envolvidos/interessados. A análise da viabilidade da continuidade das atividades empresariais é delegada aos credores, os quais, por meio do exame das propostas de reestruturação, decidirão se a manutenção do funcionamento da empresa pode ou não gerar mais valor agregado em comparação à alternativa de liquidação dos ativos em um processo de falência.

  4. Função social da empresa: Este conceito está relacionado ao impacto que a empresa em funcionamento tem na sociedade e na economia ao seu redor. Isso inclui a geração de empregos, a geração de tributos, a produção de bens e serviços essenciais e a contribuição para a economia local e nacional. Ou seja, a Lei reconhece que as empresas têm outros papeis importantes na sociedade, que vão além da simples geração de lucro em benefício do empresário ou dos sócios da sociedade empresária. É importante ressaltar, no entanto, que essa função social também pode ser gerada a partir da falência, através da exploração econômica dos ativos da empresa inviável, por outras empresas economicamente saudáveis. 

  5. Preservação do interesse dos credores: No processo de recuperação judicial, a preservação dos interesses dos credores é tão crucial quanto a sustentabilidade da empresa em crise. É essencial reconhecer e resguardar os direitos legítimos dos credores, pois serão eles a decidir, após criteriosa análise, entre a reestruturação da empresa ou sua liquidação via falência. Nesse sentido, os gestores da empresa deverão apresentar uma proposta de reestruturação do passivo que demonstre, de forma tangível e transparente, como a continuidade da empresa pode maximizar o retorno aos credores e contribuir para a economia local e sociedade em geral, em valor superior a simples venda de seus ativos a terceiros.

Portanto, podemos concluir que o processo de recuperação judicial representa uma oportunidade para que empresários e sociedades empresárias, em dificuldades econômico-financeiras, possam revitalizar seus negócios (empresas), permitindo que continuem operando e contribuindo para a economia e a sociedade. Trata-se de uma chance concedida ao empresário para que, por meio da apresentação de um plano de recuperação, demonstre e convença os credores de que a manutenção da empresa em funcionamento gerará resultados econômicos e sociais superiores a liquidação dos ativos via processo falimentar.

Doutrina, ementas, jurisprudência e artigos sobre o tema:

Manoel Justino Bezerra Filho:

“A recuperação judicial destina-se às empresas que estejam em situação de crise econômico-financeira, com possibilidade, porém, de superação; pois aquelas em tal estado, mas em crise de natureza insuperável, devem ter sua falência decretada, até para que não se tornem elemento de perturbação do bom andamento das relações econômicas do mercado. Tal tentativa de recuperação prende-se, como já lembrado acima, ao valor social da empresa em funcionamento, que deve ser preservada não só pelo incremento da produção, como, principalmente, pela manutenção do emprego, elemento de paz social.” (Bezerra Filho, Manoel Justino; Bezerra, Adriano Ribeiro Lyra; Santos, Eronides A. Rodrigues dos. Lei de recuperação de empresas e falência: Lei 11.101/2005 : comentada artigo por artigo (Portuguese Edition) (pp. 339-340). Thomson Reuters Revista dos Tribunais. Edição do Kindle.)

Daniel Carnio Costa:

“A Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, no parecer de relatoria do Senador Ramez Tebet, sobre o Projeto de Lei 71 de 2003, que deu origem a Lei 11.101/2005, especificamente sobre o princípio da separação dos conceitos de empresa e empresário, esclareceu que é imprescindível não confundir a empresa com a pessoa natural ou jurídica que a controle, pois a empresa é o conjunto organizado de capital e trabalho para a produção ou a circulação de bens ou serviços. Assim sendo ‘é possível preservar uma empresa, ainda que haja a falência, desde que se logre aliená-la a outro empresário ou sociedade que continue sua atividade em bases eficientes’” (AGENCIA SENADO, 2004) (COSTA, Daniel Carnio; MELO, Alexandre Nasser de. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência – Lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Curitiba: Juruá Editora, 2021, p. 31-32)

Marlon Tonazette:

"(...) A grande ideia da recuperação é convencer os grupos de interesse de que os ganhos serão maiores no futuro com a manutenção da atividade. O empresário deverá convencer seus credores (fornecedores, empregados...) de que é melhor abrir mão de algo nesse momento, para posteriormente ter ganhos maiores. A decisão de cada jogador nesses casos dependerá diretamente do grau de informação que eles tenham sobre o jogo, para que possam tomar a decisão que seja a mais eficiente sob o seu ponto de vista. Cabe à legislação incentivar os jogadores para que eles tenham colaboração mútua e apoiem a melhor estratégia para todos". (TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial. Falência e Recuperação de Empresas. Vol. 3. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019, pág. 77)

Legislação aplicável ao tema:

Lei 11.101/2005​​

Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

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